sábado, 5 de maio de 2007

Renato Russo - análise semântica e estilítica das suas letras.

Renato Russo: Análise semântica e estilítica das suas letras.

Análise Semântica e Estilística das Letras de Renato Russo.Para entendermos melhor, conceituarei Semântica e Estilística.Semântica: é a parte da gramática que estuda os aspectos relacionados ao SENTIDO de palavras e enunciados.Estilística: refere-se ao estilo empregado no texto, geralmente poético. As figuras de linguagem (Metáfora, metonímia, antítese, paradoxo etc...), são bastante empregadas como recursos estilísticos.1965 – (Duas Tribos)Letra: Renato Russo – Álbum: As Quatro Estações - 1989.Vou passar, quero verVolta aqui, vem vocêComo foi, nem sentiuSe era falso, ou fevereiroTemos paz, temos tempoChegou a hora e agora é aquiCortaram meus braçosCortaram minhas mãosCortaram minhas pernasNum dia de verãoNum dia de verãoNum dia de verãoPodia ser meu paiPodia ser meu irmãoNão se esqueça, temos sorteE agora é aquiQuando querem transformarDignidade em doençaQuando querem transformarInteligência em traiçãoQuando querem transformarEstupidez em recompensaQuando querem transformarEsperança em maldiçãoÉ o bem contra o malE você de que lado está?Estou do lado do bemE você de que lado está?Estou do lado do bemCom a luz e com os anjosMataram um meninoTinha arma de verdadeTinha arma nenhumaTinha arma de brinquedoEu tenho um autoramaEu tenho Hanna-BarberaEu tenho pêra, uva e maçãEu tenho GuanabaraE modelos RevellO Brasil é o país do futuroO Brasil é o país do futuroO Brasil é o país do futuroO Brasil é o paísEm toda e qualquer situaçãoEu quero tudo Pra cimaPra cimaPra cimaO título: 1965 – (Duas Tribos)1965, refere-se ao 2º ano da ditadura militar (golpe militar de 1964), onde os militares fecharam as “portas” do país, tomaram o poder e cassaram os direitos políticos de inúmeros brasileiros, dentre eles artistas, políticos e estudantes.(Duas Tribos), Os civis e eles militares, divisão entre o “Verde-oliva” e o “Paisano”, tribos opostas, o verde (exército) e o vermelho (comunista).¨ 1º momento: A ConfusãoVou passar, quero verVolta aqui, vem vocêComo foi, nem sentiuSe era falso, ou fevereiroTemos paz, temos tempoChegou a hora e agora é aquiNestes versos observemos como se deu o golpe militar de 64, os militares nunca conseguiram explicar com clareza seus feitos, os reais motivos de tomarem o poder, passaram a idéias de “algo cinza”, se confundiram tentando explicar o inexplicável. Vou passar, quero ver (passar o que? Ver o que?) Como foi, nem sentiu, Se era falso ou fevereiro, aqui se observa a real confusão do dito golpe, é “verdadeiro ou fevereiro” é real ou não é? O que é falso? O que é verdadeiro?Agora estamos no poder (Temos paz, temos tempo) provavelmente temos ou geramos a paz e todo tempo do mundo, é agora (Chegou a hora e agora é aqui) em 1964.¨ 2º momento: A Censura e/ou torturaCortaram meus braçosCortaram minhas mãosCortaram minhas pernasNum dia de verãoNum dia de verãoNum dia de verãoPodia ser meu paiPodia ser meu irmãoPara entendermos o 2º momento, temos duas vertentes: A Censura e a Tortura.A Censura: no direito se expressar (Cortaram meus braços / Cortaram minhas mãos), se não temos braços e mãos, estamos (cerceados) de expressão e não podemos “dizer” o que pensamos. (Cortaram minhas pernas / Num dia de verão) censurado os direitos de ir e vir (hoje garantidos pela constituição) em um dia ensolarado por direito.A Tortura: Usando métodos americanos de tortura física e psicológica, os militares tiveram cursos de tortura tanto aqui no Brasil, quanto nos E.U.A (Cortaram meus braços / Cortaram minhas mãos), as vezes esse “cortar” era literal mesmo, para tirarem informações que lhes interessavam. (Cortaram minhas pernas / Num dia de verão).Essa Censura ou Tortura podia acontecer com todos indiscriminadamente, comigo, você ou nossos pais e irmãos, não importando o dia. (Num dia de verão / Num dia de verão / Podia ser meu pai / Podia ser meu irmão)¨ 3º momento: Moldamento ou lavagem cerebral e traiçãoNão se esqueça, temos sorteE agora é aquiQuando querem transformarDignidade em doençaQuando querem transformarInteligência em traiçãoQuando querem transformarEstupidez em recompensaQuando querem transformarEsperança em maldiçãoO 3º momento é uma crítica aos métodos de persuasão dos militares, e como eles faziam o povo “engolir de goela a baixo” o seu “poder”, ás suas vontades, “vomitando” sobre o povo seus ideais. (Quando querem transformar / Dignidade em doença), afinal a sua dignidade é ou não uma doença? Ou seja, ser digno é ser transformado em doente.Eram usados pelos militares variados métodos de investigação (chamados: Inteligência) inclusive todas polícias do mundo usam esse método, o exército usa e dá o nome de 2ª Seção e na PM de PM2, ou seja, é uma Seção que normalmente entrega os próprios colegas de farda (Quando querem transformar / Inteligência em traição), eles traíam os próprios colegas e os civis nem se fala, eram fichados e investigados, o ex-presidente FHC, tinha uma ficha lá.Os militares veladamente protegiam e pagavam uma espécie de recompensa para quem os ajudasse com informações sigilosas de cunho político (Quando querem transformar / Estupidez em recompensa)Normalmente aos perseguidos políticos lhes restavam a boa vontade dos seus opressores e a única chance de vida era a esperança em não ter esperança(Quando querem transformar / Esperança em maldição)¨ 4º momento: Há dois caminhos, qual o seu?É o bem contra o malE você de que lado está?Estou do lado do bemE você de que lado está?Nesse momento Renato Russo admite a existência da velha e conhecida luta do bem contra o mal, (É o bem contra o mal) que há dois conhecidos caminhos e questiona-nos para qual vamos pender (E você de que lado está?). Ele afirma ou um civil brasileiro qualquer de que está do lado dos civis, aqui representado pelo bem (Estou do lado do bem), sendo então o “mal” representado pelo exército ou os militares da época. O Eu-lírico reafirma que está do lado do bem, insiste em dizer que tem uma opinião formada e não pretende mudar de lado. (Estou do lado do bem / Com a luz e com os anjos)¨ 5º momento: AtrocidadesMataram um meninoTinha arma de verdadeTinha arma nenhumaTinha arma de brinquedoO 5º momento é o ápice das atrocidades da ditadura brasileira, é uma crítica em se matar inocentes por muito pouco (Mataram um menino) e eles tinham armas reais (Tinha arma de verdade). Já os meninos (o povo) eram indefesos não tinham com o que matar ou com o que se defender (Tinha arma nenhuma) e ainda que tivessem algumas, eram armas inocentes e de brinquedo (Tinha arma de brinquedo).¨ 6º momento: BurguesiaEu tenho um autoramaEu tenho Hanna-BarberaEu tenho pêra, uva e maçãEu tenho GuanabaraE modelos RevellO 6º momento é um tapa na cara de milhões de brasileiros, é a expressão do esbanjamento dos militares que estavam no poder vs a sociedade cerceada. Naquela época quem tinha um brinquedo autorama? Quem conhecia os desenhos animados de Hanna Barbera? (Eu tenho um autorama / Eu tenho Hanna-Barbera).E esse momento ainda vai criticando agora com a comida que ele podiam comprar, (Eu tenho pêra, uva e maçã) o povo às vezes comiam essas frutas quando estavam doentes. A burguesia vai sendo criticada por onde se podiam morar e comprar (Eu tenho Guanabara / E modelos Revell) só os ricos sabiam o que era isso. Modelos Revell eram carinhos de brinquedo (modelismo).¨ 7º momento: País do presenteO Brasil é o país do futuroO Brasil é o país do futuroO Brasil é o país do futuroO Brasil é o paísEm toda e qualquer situaçãoEu quero tudo Pra cimaPra cimaPra cimaNesse ultimo momento é uma critica ao Brasil da época, por ser um país dito “do futuro”, somos um país do futuro até quando? Temos que ser um país do presente, o futuro é agora, já, aqui mesmo, agora!!! Há uma ênfase (O Brasil é o país do futuro / O Brasil é o país do futuro / O Brasil é o país do futuro) nesse futuro que parece ser distante e que nunca chegará. Mas seja qual for a situação o povo brasileiro é valente e acredita no país e tem esperança que esse futuro não tarde muito e que em breve chegará (fim da ditadura), com liberdade de expressão, de ir e vir entre outras (Em toda e qualquer situação / Eu quero tudo Pra cima / Pra cima / Pra cima).Vejamos agora algumas estruturas estilísticas:1º momento:1 Vou passar, quero ver2 Volta aqui, vem você3 Como foi, nem sentiu4 Se era falso, ou fevereiro5 Temos paz, temos tempo6 Chegou a hora e agora é aquiO 1º momento apresenta-nos dois grupo: um de quatro versos e outro de dois, totalizando seis versos. Tem uma métrica não padronizada de seis sílabas, os terceiro e quarto versos são brancos (não rimam), já os quinto e sexto versos, além de serem brancos, são livres (medida não padronizada).Nota-se que no quarto verso (Se era falso, ou fevereiro) há um paradoxo, intencionalmente ou não, a rima mais bem aplicada seria: (Se era falso, ou verdadeiro).2º Momento7 Cortaram meus braços8 Cortaram minhas mãos9 Cortaram minhas pernas10 Num dia de verão11 Num dia de verão12 Num dia de verão13 Podia ser meu pai14 Podia ser meu irmãoAqui temos oito versos, dois grupos de quatro, há a utilização de Anáfora nos dois grupos (Cortaram, Cortaram, Cortaram), (Num, Num e Podia, podia), os versos são livres, mas não são brancos.3º Momento15 Não se esqueça, temos sorte16 E agora é aqui17 Quando querem transformar18 Dignidade em doença19 Quando querem transformar20 Inteligência em traição21 Quando querem transformar22 Estupidez em recompensa23 Quando querem transformar24 Esperança em maldiçãoAqui temos dez versos, cinco grupos de dois, há também a utilização de Anáfora (Quando, quando, quando), são versos livres e possuem rima.4º Momento25 É o bem contra o mal26 E você de que lado está?27 Estou do lado do bem28 E você de que lado está?Aqui temos quatro versos, são versos livres e possuem rimas interpoladas sonoras por repetição. Há uma comparação interrogativa.5º Momento29 Mataram um menino30 Tinha arma de verdade31 Tinha arma nenhuma32 Tinha arma de brinquedoAqui temos quatro versos, são versos livres e brancos, há também Anáfora (Tinha arma, tinha arma, tinha arma), há ainda contradição enfática paradoxal (Arma de verdade / Arma de brinquedo).6º Momento33 Eu tenho um autorama34 Eu tenho Hanna-Barbera35 Eu tenho pêra, uva e maçã36 Eu tenho Guanabara37 E modelos RevellAqui temos cinco versos, são versos livres e (rima velada), há também Anáfora (Eu tenho, Eu tenho, Eu tenho), há ainda o recurso de Metonímia, a marca pelo produto (33 Eu tenho um autorama), o autor pela obra (34 Eu tenho Hanna-Barbera), a matéria pelo objeto (pêra, uva e maçã), a marca pelo produto (Modelos Revell), carinhos de brinquedo.7º Momento38 O Brasil é o país do futuro39 O Brasil é o país do futuro40 O Brasil é o país do futuro41 O Brasil é o país42 Em toda e qualquer situação43 Eu quero tudo Pra cima44 Pra cima45 Pra cimaNesse momento temos oito versos, divididos em dois grupos de quatro, há também Anáfora (O Brasil é, O brasil é, O brasil é) há ainda o recurso de comparação excessiva.outros pedidos, Poeta Silva Neto pegosine@hotmail.com
Silva Neto
Publicado no Recanto das Letras em 10/09/2006Código do texto: T236925

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